segunda-feira, 16 de dezembro de 2024

O Grau 17 do REAA – “Cavaleiro do Oriente e do Ocidente” 24/11/2020



Avental do Grau 17 – Cavaleiro do Oriente e do Ocidente (REAA)

Núcleo histórico

O Grau 17, chamado Cavaleiro do Oriente e do Ocidente, não obstante o Ritual fazer referências aos essénios, aos temas do Apocalipse e outras tradições gnósticas e herméticas, é, na verdade, um grau que tem ligações  muito forte com os cavaleiros cruzados, especialmente os templários. O próprio título assim o sugere, uma vez que os cruzados eram, efectivamente, cavaleiros que vieram do Ocidente para estabelecer um reino cristão no Oriente. Este reino, com a sua capital em Jerusalém, durou quase dois séculos, desde a tomada de Jerusalém em 1099 pelos cruzados, até 1187, quando a cidade foi retomada pelos muçulmanos comandados por Saladino, sultão do Egipto. Neste período de domínio cristão na Terra Santa foram fundadas diversas ordens de cavalaria, sendo as três mais importantes, as Ordens dos Templários, dos Hospitalários e dos Cavaleiros Teutónicos. Cada uma destas Ordens legou importantes tradições à Maçonaria contemporânea, todas elas reproduzidas, de forma simbólica, nos ritos praticados actualmente.

A lenda cultivada no grau 17 do Rito Escocês Antigo e Aceito, embora apresente alguns absurdos históricos, não obstante, desenvolve alguns ensinamentos bastante interessantes. Diz esta lenda que após a tomada de Jerusalém pelos romanos, facto esse ocorrido no ano 70 da era cristã, alguns judeus fugiram para o deserto, dando origem à seita dos essénios. Trata-se, evidentemente de um grosseiro erro histórico, uma vez que os essénios já existiam antes mesmo de os romanos chegarem à Palestina, já que a origem dessa seita se situa no século II antes de Cristo, época em que Roma ainda estava lutando contra os cartagineses pelo controle do Mediterrâneo.

A lenda sugere que muitos dos símbolos e ensinamentos que fundamentam a ritualística e as tradições cultivadas nos graus filosóficos são inspirados nos costumes desta seita fundamentalista que, segundo crêem alguns historiadores, teria sido a inspiradora da doutrina ensinada por Jesus. Esta alusão aos essénios como uma importante fonte de influência da Maçonaria é correcta e já foi referida por nós noutros trabalhos já publicados neste site.

A lenda do grau diz também que a Ordem dos Templários foi fundada após o regresso dos cruzados da Terra Santa. Este também é outro equívoco, pois é facto sabido que esta Ordem  foi fundada durante o período de domínio cristão na Terra Santa, e tinha a sua sede na própria cidade de Jerusalém, nas ruínas do antigo Templo de Jerusalém, razão pela qual ela adoptou o nome de “Ordem dos Pobres Cavaleiros de Cristo e do Templo do Rei Salomão”. É possível que, neste caso, o ritual do grau se esteja referindo ás Lojas de Companheiros, nascidas da interacção entre cavaleiros templários e maçons operativos, que depois que os cruzados deixaram a Terra Santa, se multiplicaram pela Europa, dando origem às Lojas maçónicas modernas, como porém o ritual omite este pormenor, não temos como avalizar a sua historicidade;

O Apocalipse

O ritual também se refere constantemente ao Livro do Apocalipse, e utiliza vários dos seus simbolismos para veicular os ensinamentos do grau.

O Apocalipse é um livro essencialmente gnóstico e foi escrito por um filósofo que possuía profundos conhecimentos das doutrinas desses cultores do cristianismo místico. Possivelmente era um essénio, conhecedor dos métodos cabalísticos de interpretação da Bíblia, o qual, tendo conseguido escapar do massacre perpetrado pelos romanos aos membros daquela seita, adoptou a crença cristã e passou a emprestar à nova religião todos os seus conhecimentos [1].

O autor, que presumivelmente era um preso político confinado na ilha de Patmos, relata as suas visões a respeito do futuro da igreja que naquele momento se estava formando no mundo romano, decorrente das pregações dos cristãos, e sobre o destino do Império Romano e da própria humanidade. Escrito á maneira dos essénios, com larga utilização de símbolos, metáforas, analogias e metonímias, ele criou uma obra criptográfica digna dos mais competentes autores herméticos.

Esta forma de escrita era muito comum na época pois destinava-se a veicular teses, opiniões e mensagens políticas e religiosas combatidas pelo poder secular.

O Apocalipse é, na verdade, um libelo crítico e propagandístico. Veicula críticas contundentes ao Império Romano e as suas autoridades, ao mesmo tempo que procura demonstrar a superioridade do cristianismo sobre as demais crenças religiosas da época. Objectiva também demonstrar que Jesus Cristo era, realmente o Filho de Deus, e somente á ele cabia a missão salvadora da humanidade.

As teses desenvolvidas pelo autor do Apocalipse demonstram claramente que ele era adepto da filosofia gnóstica. A sua concepção acerca do “Cordeiro de Deus”, que tira o pecado do mundo, é uma alegoria que já tinha sido utilizada antes pelos essénios e outros pensadores gnósticos. Outra pista das influências gnósticas e cabalísticas do autor é a sua fixação em temas místicos, como os números sete e doze, que têm larga utilização na tradição cabalística e na própria simbologia da Bíblia.

É sabido que estes dois números, para místicos gnósticos e cabalistas eram números sagrados por natureza. O sete simbolizava a vitória do espírito sobre a matéria e a predominância do bem sobre o mal, e o doze era o símbolo da organização universal. Por isso sete são as igrejas para as quais ele escreve, sete os anjos que as identificam, sete são os castiçais que iluminam o Filho do Homem, sete são as estrelas na sua mão direita, sete selos no Livro do Cordeiro, etc. [2].

Da mesma forma, doze sãos as portas da Jerusalém Celeste, doze os discípulos do Cordeiro, doze as tribos de Israel, etc. [3].

A lenda do grau

A lenda do grau é desenvolvida com fulcro na alegoria dos Quatro Cavaleiros do Apocalipse. Esta passagem consta do capítulo 6 desse estranho livro. Fala de um cavalo branco montado por um cavaleiro vitorioso que submetia todas as nações da terra. Este simbolismo referia-se ao exército romano, então invencível. Depois vinha um cavalo vermelho, conduzindo um soldado com uma espada tinta de sangue. Este cavaleiro simbolizava o próprio Império Romano, cujas conquistas eram geralmente sangrentas. Em seguida um cavalo preto vem conduzindo um cavaleiro com uma balança nas mãos, simbolizando a justiça romana, que dava mais valor aos tributos pagos pelos povos subjugados do que á vida dos seus cidadãos; por fim, um cavalo amarelo trazia no seu dorso um cavaleiro esquelético que simbolizava a Morte. Este cavaleiro dizimava uma quarta parte da população terrestre.

Esta visão não deixava de ter uma certa confirmação com a realidade vivida nos dias do autor. Com efeito, vivia-se a época de Domiciano, um dos mais cruéis imperadores que Roma teve. A sua época ficou conhecida como “Era dos Mártires”, graças á terrível e sangrenta repressão praticada contra os cristãos. Morte, fome, guerra, peste eram ocorrência constantes naquela época, razão pela qual esse é um tema recorrente no Apocalipse. Por ser um tempo de terríveis aflições para os cristãos, o poder imperial de Roma é pintado como sendo a “besta dos dez cornos e quatro cabeças, que usa dez coroas e tem sobre elas títulos blasfemos” [4].

A própria Roma, na visão do autor é governada por uma “besta”, cujo número é 666. Este número corresponde, na Cabala, ao nome do Imperador romano Nero, o primeiro monarca romano a promover uma sistemática perseguição aos cristãos. Estigmatizando este imperador através deste número maligno, o autor estava, não só denunciando-o como um dos mais terríveis inimigos de Cristo, como também lançando sobre ele um sortilégio ruim, pois a sequência de seis, representava, na arte da Aritmosofia, uma série maligna [5].  É que, cerca das suas décadas antes de ser escrito o Apocalipse, as tropas romanas tinham invadido a Judeia e massacrado a maior parte dos seus habitantes. Destruíram também Jerusalém e botaram abaixo o Templo. Depois expulsaram os judeus da Palestina, dando nascimento ao episódio que na história ficou conhecido como Diáspora [6].

O autor do Apocalipse evoca estes acontecimentos e faz da sua obra um libelo acusatório contra Roma e lança uma profecia de esperança de ressurgimento do povo e do estado judeu, desta vez sob a égide da crença cristã, e governado pelos seguidores do Messias.

O Ensinamento iniciático do grau 17

A esperança messiânica foi o gancho no qual os organizadores do ritual do grau 17 ligaram as tradições judaicas referidas no Apocalipse, com os temas da Cavalaria cruzada, que aparentemente nenhuma conexão, a não ser o local onde elas nasceram, têm entre si. Todavia, como veremos nos graus superiores, especialmente os graus 28 a 32, existe uma identidade simbólica entre esses temas, que torna o catecismo maçónico um conjunto temático bastante uniforme entre si.

Desta forma, o ensinamento iniciático do grau 17 procura passar ao iniciado a ideia de que os templários, antecessores dos maçons, na verdade, são os herdeiros espirituais da tradição israelita que faz daquele povo um “grupo eleito” entre os povos da terra para guardar esta tradição. Esta tradição seria encampada pelos cruzados e defendida com unhas e dentes pelas Ordens de Cavalaria que eles fundaram para apoiar as suas pretensões. Esta ideia reflecte-se principalmente na saga dos cavaleiros templários, que se tornaram uma potência política, económica e religiosa, cujo poder desafiou a própria Igreja e por isso mesmo acabou sendo suprimida violentamente.

Desta tradição originaram-se as várias concepções que colocam os templários como herdeiros espirituais dos primeiros cristãos e detentores dos seus verdadeiros ensinamentos e segredos. Eles seriam, por emulação deste conceito, os portadores da Nova Aliança, os habitantes da Nova Jerusalém citada pelo autor do Apocalipse. Por isso encontraremos, praticamente em quase todos os graus filosóficos, referências a este tema [7].

Assim, o simbolismo do grau 17 efectua a transição entre as tradições do Velho Testamento, expresso na Lenda de Hiram, a reconstrução de Jerusalém, a filosofia das seitas judaicas, e o Novo Testamento com as doutrinas pregadas por Jesus; e a partir dessa transição integra a filosofia gnóstica e hermética, adoptada pelos cavaleiros templários na Terra Santa e repassada aos novos “cavaleiros”, que são os maçons.

João Anatalino Rodrigues

Do livro “Conhecendo a Arte Real” – Madras, 2007

[1] O Apocalipse é atribuído a São João Evangelista, o mesmo autor do Evangelho que leva o seu nome. Dificilmente porém, este autor seria o chamado “discípulo amado”, que fez parte do grupo dos doze que acompanhou Jesus no seu magistério. A diferença entre os seus escritos e os chamados “sinópticos”, evangelhos que tratam mais dos feitos de Jesus do que da sua doutrina, são patentes. O Evangelho de João e o Apocalipse são livros de clara inspiração gnóstica.

[2] Sete também são as letras que aparecem estampadas em cada um dos selos que lacram o Livro do Cordeiro. Estas letras são B,D,S,P,H,G,F. São as iniciais dos nomes dos sete querubins que guardam os sete céus da tradição gnóstica. Estes nomes e esta tradição também é referida nos ensinamentos dos graus filosóficos do Rito Escocês.

[3] Por isso a “nova tribo” que será salva depois do Juízo Final será composta de 144.000 convertidos. Este número nada mais é que o número  12 multiplicado por 12.000, inspiração tipicamente cabalística, extraída da matriz israelita dos 12 filhos de Jacob, núcleos das 12 tribos de Israel. Significa que cada tribo de Israel contribuirá com 12.000 pessoas para a Jerusalém Celeste.

[4] Dez eram as divisões territoriais que o Império Romano adoptava como províncias; quatro eram os poderes imperiais, representado pelo Imperador, o Senado, o Exército e o Corpo Judiciário; os nomes “blasfemos” eram os títulos de deuses que as autoridades supremas de Roma adoptavam  para si mesmas.

[5] Veja-se a este respeito Hugh Schonfield – A Bíblia Estava Certa – ED. Ibrasa, 1986

[6] Os judeus seriam autorizados a voltar à Palestina no começo do século II. Jerusalém foi reconstruída pelos romanos em 144 da era cristã, com o nome de Aélia Capitolina. O estado judeu, entretanto, só seria reconstituído em  1948.

[7] Especialmente a reconstrução de Jerusalém, a Jerusalém Celeste, bem como as referências á várias tradições cultivadas pelos templários, como a lenda de Bafhomet, a Escada Mística, Os Cavaleiros Teutónicos, etc.


 

Grau 16 – Príncipe de Jerusalém (REAA)



Avental do Grau 16 – Príncipe de Jerusalém

O fundamento do grau

O Príncipe de Jerusalém, título que corresponde ao grau 16 da Maçonaria do Rito Escocês, desenvolve ensinamentos que encarecem o valor da fidelidades, da coragem e do zelo. A lenda do grau refere-se às lutas que os judeus empreenderam contra os palestinos- povos que ocuparam Jerusalém e outras cidades de Israel após eles serem levados cativos para a Babilónia – e que, vendo os judeus voltarem para Jerusalém após a derrota dos caldeus frente aos persas, iniciaram contra eles uma guerra que até hoje está sendo travada.

Assim, já nesta época (Século V a. C.) uma atmosfera de conflitos, intrigas políticas, escaramuças e não raramente, verdadeiras guerras, sacudiam aquela região que os antigos israelitas chamavam de Terra Prometida.

Como já dissemos em estudos anteriores, a Maçonaria dos graus filosóficos utiliza-se fundamentalmente da metáfora da reconstrução de Jerusalém como alegoria para a sua proposta de reconstrução do carácter do homem e da sua sociedade. E em todos os graus, do 14 ao 18, iremos encontrar temas referentes á construção e reconstrução da cidade santuário, pois esta simboliza a própria humanidade nas suas ascensões e quedas. No grau 16 encontraremos as alusões aos conflitos entre os judeus repatriados da Babilónia, que comandados por Zorobabel, intentam reconstruir Jerusalém e voltar a ter nela o seu Templo e torná-la novamente a sua capital. Os povos que habitam a região vêem nisso um perigo e armam uma série de intrigas tentando atrair a ira e a desconfiança do rei persa contra os judeus.

Historicamente toda a temática do ritual do grau é fundamentada nas crónicas de Esdras e nos trabalhos de acomodação e de defesa que o rabino Zorobabel montou para defender os judeus e os trabalhos de reconstrução que estavam fazendo em Jerusalém. A Bíblia diz que eles “com uma mão operavam a trolha e na outra mantinham em guarda o escudo e a espada”. Nesta metáfora está a proposição firme de reconstruir a sua civilização destruída e defendê-la a custo da própria vida.

Encontraremos também, como destaque no ensinamento do grau o propósito de se buscar o justo equilíbrio entre os interesses que se defende e a verdadeira justiça. Esta proposição encontra fundamento na informação bíblica que diz que Zorobabel, após ter obtido o apoio do Rei Ciro para a reconstrução do Templo e das muralhas de Jerusalém, nomeou cinco dos seus melhores mestres para fazer a administração da Justiça. Esta medida foi uma grande jogada política de Zorobabel, pois acalmou o povo palestino e amainou os conflitos entre estes e os judeus, obtendo do monarca persa uma impressão favorável, o que muito contribuiu para que este tratasse os habitantes da região com simpatia. Desta forma, pode os trabalhos de reconstrução prosperar e a administração foi novamente recomposta. Aqui se reforça mais uma vez uma das vigas mestras da prática maçónica, que é tolerância.

Assim, no sexto ano do reinado do Rei Ciro, os judeus terminaram a reconstrução do seu Templo e a paz voltou àquela região.

A Bíblia fala da Nova Aliança firmada por Zorobabel e os israelitas que voltaram com ele do cativeiro da Babilónia com o Senhor. O ritual do grau 16 é uma metáfora deste novo compromisso. Em todos os sentidos esta Nova Aliança deveria ser uma reedição do pacto firmado por Moisés, com a promessa de que, doravante, o agora povo judeu(o reino de Israel desaparecera dois séculos antes destruído pelos assírios), não transgrediria as leis de Deus. Diz Esdras que

todos os que tinham discernimento deram palavra pelos seus irmãos; os seus magnates e os que vieram prometer e jurar que andariam na lei de Deus, que o Senhor tinha dado à Moisés, servo de Deus , que guardariam e observariam todos os mandamentos do Senhor Nosso Deus e as suas ordenanças e cerimónias, e que assim não daríamos nossas filhas ao povo da terra, nem tomaríamos as filhas deles para esposas dos nossos filhos”.

(Esdras, 28,30)

Nota-se, nas entrelinhas deste texto, a disposição dos judeus de conservar a pureza racial, religiosa e cultural do seu povo, evitando, a todo custo a miscigenação. A antiga ideia, que sempre esteve presente na cultura desse povo, de que Israel é uma “Confraria”, uma nação diferenciada, unida pelos laços da Irmandade, ainda sobrevivia na alma deles, mesmo depois de todas vicissitudes sofridas ao longo da sua sofrida saga. É esta disposição, aliás, em grande parte conservada até hoje, que manteve viva a comunidade de Israel por todos esses séculos, mal-grado os ataques e as tentativas de extermínio que os judeus têm sofrido ao longo da sua história.

Por isto, talvez, que a moderna Maçonaria se tenha inspirado na saga de Israel para desenvolver o seu próprio conceito de Irmandade. Nenhum outro povo jamais foi tão firme, mais fiel e mais apegado à sua tradição do que o povo de Israel. A sua conformação como povo, como comunidade e como nação, assemelha-se realmente à uma Confraria, viva onde eles viverem e seja qual for a cultura em que eles estiverem inseridos. Nem os caldeus, que os levaram cativos para a Babilónia, ou os romanos, seiscentos anos mais tarde, que os espalharam pelo mundo, ou os nazistas com a sua proposta de solução final para os que eles entendiam ser o “problema dos judeus”, conseguiram fazer com que eles deixassem de existir.

O exemplo de resistência dos judeus é a prova cabal de que a maior defesa de um povo está no respeito às suas tradições e no apego à uma crença de que existe um Ser maior que nos protege, e que a história tem um sentido escatológico que se cumpre segundo a Vontade desse Ser. E ao vivermos as nossas vitórias e derrotas, as nossas ascensões e quedas, estamos dando cumprimento a esse processo. Não precisamos sofrer por isso nem temer apocalipses futuros, pois o destino da humanidade está nas mãos de Deus e só ele sabe o que se deve fazer com ela.

Por isto, enquanto outros povos, mais fortes e mais desenvolvidos, cultural e cientificamente do que os judeus já viraram apenas referências nas páginas da História, Israel continua vivo. A sua história é um exemplo de tenacidade, resistência, esperança e fé num destino traçado pela mão de Deus, e não apenas a consequência de um materialismo histórico, governado por leis exclusivamente naturais.

Mais do que isto, a história de Israel mostra-nos que a ideia de Fraternidade, de Confraria, e “Eleição” por um poder maior, e no compartilhamento de um ideário formado de símbolos, mitos, crenças e esperanças comuns, é que fazem a força de um grupo. Israel sobreviveu a todas as tragédias que se abateu sobre o seu povo graças ao seu “kitch” cultural.

É neste simbolismo, onde se releva o valor da Fraternidade, o apego à tradição comum, o zelo pela cultura e a fé na sua crença ancestral, que a Maçonaria moderna se estriba para mostrar aos seus iniciados quais as virtudes que devem ser cultivadas pelos Irmãos.

O ritual do grau refere-se também a uma batalha que os judeus repatriados teriam travado com os samaritanos na passagem de uma ponte no Rio Tigre. Esta batalha é conhecida como a “Passagem da Ponte” e tem um valor simbólico muito importante dentro do ensinamento do grau. Significa que quando há propósito a ser cumprido toda acção é uma batalha para a conquista de uma ponte. E ela deve ser travada com coragem e confiança na vitória, pois haverá sempre um “inimigo” para nos tentar afastar dos nossos propósitos.

Os ensinamentos do grau 16 procuram pois, integrar a tradição israelita de eterna construtora e reconstrutora de um edifício que é destruído e reconstruído muitas vezes, até que atinja a sua forma perfeita (tal como o carácter do homem e a sua sociedade) com a ideia de que, para atingir esta formulação é preciso que o homem aprenda a viver em verdadeira Fraternidade, buscando a verdadeira Justiça. (…)

João Anatalino Rodrigues

Do livro – Conhecendo a Arte Real – Ed. Madras, São Paulo – 2007


 

quarta-feira, 11 de dezembro de 2024

Grau 15 – Cavaleiro do Oriente (REAA) 01/10/2022

 



Avental do Grau 15 – Cavaleiro do Oriente (REAA)

Embora se trate de um grau de inspiração templária, o Grau 15, chamado Cavaleiro do Oriente, é feito em cima da crónica bíblica que trata da reconstrução do Templo de Jerusalém comandada por Zorobabel, indo até à sua destruição, em a.D. 70.

Historicamente, o personagem chamado Zorobabel foi um rabino, líder dos judeus que voltaram para Jerusalém com a permissão do rei Ciro, da Pérsia, após aquele rei ter derrotado os caldeus e libertado os povos que eles tinham levado cativos para a Babilónia. Diz o cronista Esdras que se tratavam de 42.360 pessoas, além dos seus servos e servas, o que pressupõe que os judeus, já nessa época, não viviam mais como cativos no império persa.

Todavia, naquele tempo, como hoje, a Palestina não era habitada somente pelos descendentes de Israel. A volta de um tão vasto contingente de pessoas para aquela terra, sabidamente tão pobre em recursos naturais, trouxe muita preocupação para os povos da região. A começar pelo abastecimento de água-toda a água potável da Palestina vem do Lago Genesaré, o chamado Mar da Galileia-, os parcos recursos naturais da região são disputadíssimos pelos povos de diversas etnias que ali se fixaram. Este é motivo da eterna situação de conflito existente naquele conturbado pedaço de terra chamado Palestina.

Este novo êxodo de judeus para a região logo degenerou em conflito. Esdras fala da feroz oposição dos samaritanos, embora deixe transparecer na sua crónica que essa oposição foi causada pelos próprios judeus, que não permitiram que os seus rebeldes conterrâneos do Norte participassem da reconstrução do Templo. Como eram muitas as incursões dos inimigos de Israel contra o canteiro de obras, Zorobabel criou uma espécie de milícia para protegê-lo. Os pedreiros, ao mesmo tempo em que trabalhavam na construção, a defendiam, “mantendo numa mão a trolha e a argamassa e na outra a espada”.

Esdras descreve assim essa restauração:

“No primeiro ano do rei Ciro, ele ordenou que a Casa de Deus, que há em Jerusalém fosse reedificada no lugar onde que se oferecem sacrifícios, e que se lhe pusessem uns fundamentos que sustentassem a altura de sessenta côvados, três fiadas de pedra por polir e do mesmo modo fileiras de madeira nova; e que a despesa se fizesse da casa do rei. E que restituíssem também os vasos de ouro e prata do Templo de Deus, que Nabucodonosor tirara do Templo de Jerusalém, e levara para a Babilónia, e que se reconduzissem para o Templo e os pusessem no seu lugar”.

Assim, foi graças à disposição do rei persa que Zorobabel voltou para Jerusalém, comandando um exército de construtores para reconstruir o Templo de Salomão. É nesse episódio que se fundamenta a lenda do grau 15.

De notar que Cavaleiros do Oriente eram os cruzados que, Séculos mais tarde, foram para a Terra Santa para lutar contra os muçulmanos que tinham capturado Jerusalém e proibiram os cristãos de visitar os seus lugares santos.

Ao reconquistar a cidade santa, esses cruzados adoptaram diversas tradições dos antigos judeus, inclusive os costumes por eles utilizados, de se comunicarem através de palavras, senhas e sinais, já que eram estranhos numa terra estrangeira e os nativos geralmente lhes eram hostis. A Irmandade sobre a qual se fala no ritual deste grau é a Ordem dos Cavaleiros Templários, que por suposto seria a antecessora da Maçonaria. Mas por questões de desenvolvimento ritual, toda a ambientação e as referências históricas estão vinculadas à reconstrução do Templo de Salomão, promovida por Zorobabel no inicio do século IV a.C. após a conquista persa.

A lenda do Grau 15

A lenda do grau 15 diz que alguns judeus que fugiram para o Egipto por ocasião da invasão dos caldeus tinham voltado para Jerusalém após a conquista persa e constituído um grupo secreto para estudar e promover a reconstrução do Templo de Salomão. Este grupo – uma espécie de Loja Maçónica Operativa – mantinha-se na clandestinidade exactamente para evitar o ataque das populações hostis da região. Os seus integrantes identificavam-se através de palavras de passe e sinais secretos. Eram membros remanescentes daqueles Perfeitos e Sublimes Maçons, conhecedores da Palavra Sagrada, que são referidos no grau 14.

Zorobabel, ao voltar para Jerusalém, fez contacto com eles e se fez reconhecer como um Perfeito e Sublime Maçom, dando-lhes a Palavra Sagrada. Vendo a firme disposição daqueles Irmãos em reconstruir o sagrado edifício, ele empenhou-se junto ao rei Ciro para que ele permitisse e financiasse a reconstrução. O rei persa concordou, mas pressionou o líder judeu para que ele revelasse os segredos do grupo, ao que ele, valentemente resistiu. Comovido com a firme disposição dos judeus e impressionado com a fidelidade de Zorobabel, o rei dispôs-se a ajudá-los, liberando todos os seus compatriotas para trabalhar na obra e fornecendo os recursos financeiros necessários, além de devolver os utensílios que Nabucodonosor, rei dos caldeus, tinha pilhado por ocasião da conquista de Jerusalém cerca de quarenta anos antes. Foi então que Zorobabel voltou à Jerusalém, e junto com outro rabino, de nome Neemias, coordenou a reconstrução do Templo.

Símbolos e ensinamentos do grau

Entre os símbolos utilizados no ritual do grau 15, destacam-se, entre outros motivos, francamente inspirados em tradições cavalheirescas, a fita verde representando ossos, espadas inteiras e quebradas, e membros humanos decepados, desenhados sobre uma ponte onde estão marcadas as iniciais L. P. D. Essas iniciais, bem como esses símbolos evocam as batalhas travadas pelos israelitas para voltar para Jerusalém e defender as obras de reconstrução e também as próprias batalhas travadas pelos cruzados para conquistar e manter Jerusalém.

O ensinamento contido na simbologia do grau diz-nos que por mais que o Irmão seja pressionado, seja pelas autoridades, seja pela sua própria condição de vida, ele jamais se deve afastar dos princípios ensinados pela boa Maçonaria. Esses princípios estão calcados principalmente na fidelidade e na disposição de permanecer firme na postura ética e moral que adoptou quando do seu ingresso na Ordem. Assim, ser um Cavaleiro do Oriente, significa seguir o exemplo de Zorobabel, que mesmo pressionado pelo rei persa para revelar os segredos da Irmandade, não entregou os seus Irmãos, não revelou os segredos da Ordem, não compactuou nem se acovardou ante o ataque dos inimigos e prosseguiu, impassível, na resolução que tomou.

Assim deve ser o Maçom. Uma vez tomada a resolução de “reconstruir o templo interno do seu espírito”, essa disposição não deve ser jamais abandonada. Deve empreendê-la com a coragem de um Cavaleiro de Cristo e a fé de um israelita. E sobretudo, crer que a sua fé, o seu zelo, fidelidade e coragem serão, afinal recompensados.

João Anatalino Rodrigues – Do livro “Conhecendo a Arte Real”, Ed. Madras, São Paulo, 2007


Grau 14 – Perfeito e Sublime Maçom (REAA) 16/09/2022

 




Avental do Grau 14 – Perfeito e Sublime Maçom (REAA)

Perfeito e Sublime Maçom, também chamado de Grande Eleito da Abóbada Sagrada, corresponde ao iniciado que, no Rito Escocês, atinge o grau catorze. Este titulo é dado àquele que galgou todos os degraus das Lojas de Perfeição, tendo cumprido o curriculum previsto para esta etapa. O titulo não significa, entretanto, que a escalada terminou. O que se supera é apenas a primeira etapa de uma longa jornada. As virtudes consagradas no grau são a autodisciplina, a constância, a solidariedade, a fraternidade e a discrição, que deve acompanhar os maçons conhecedores do sagrado mistério que representa a pronúncia do Verdadeiro Nome de Deus. Esta é, pelo menos, a mensagem passada pela lenda do grau.

Em termos iniciáticos, o Perfeito e Sublime Maçom é aquele que procura a Palavra Perdida da lenda de Enoque. A lenda do grau diz que esre título foi criado por Salomão justamente para premiar os Mestres que encontraram a Palavra Sagrada oculta por Enoque. Após a construção e a consagração do templo, a maioria dos mestres que foi elevada ao grau de Cavaleiro do Arco Real voltou para as suas terras. A Maçonaria disseminou-se por toda parte e perdeu qualidade, sendo os seus segredos compartilhados por muitos iniciados sem mérito. Várias disputas e cisões acabaram por desvirtuar a Ordem, de um modo geral. Somente os eleitos que prometeram e cumpriram o juramento do grau perseveraram na prática da verdadeira Arte Real e as transmitiram a uns poucos.

Quando o Templo de Jerusalém foi tomado pelas tropas babilónicas, foram estes poucos eleitos que defenderam o Altar do Santo dos Santos, e por, fim quando toda resistência se tornou inútil, eles mesmos penetraram na Abóbada Sagrada e destruíram a pedra onde o Nome Inefável estava gravado. Em seguida, sepultaram os escombros num buraco de 27 pés de profundidade para que, numa futura restauração do templo, ou da Aliança, a posteridade pudesse recuperá-lo. Assim, o Nome Inefável nunca mais foi escrito nem pronunciado, mas apenas soletrado, letra por letra. E só os Perfeitos e Sublimes Maçons ficaram conhecendo essa pronúncia.

Esta alegoria reflecte claramente um retrato do momento em que o grau foi criado, ali pela metade do século XVIII. Nesta época, a Maçonaria enfrentava um processo de muitas cisões, oriundas de controvérsias e conflitos de ordem ritualística, doutrinária e mesmo políticas. Opunha-se à Maçonaria inglesa, anglicana e protestante, com a sua tentativa de unificação empreendida por Anderson e o seu grupo, a Maçonaria francesa e alemã, jacobita, stuartista e católica.

A primeira, dirigida para um objectivo moral e filosófico, fundamentado nos princípios do Iluminismo, e a segunda orientada mais por sentimentos políticos, temperados por um apelo emocional ao passado, representado pelo esoterismo rosa-cruciano e pela tradição da cavalaria templária. Foi a unificação dessas duas tendências que originou o Rito Escocês como hoje o conhecemos. Esta unificação, curiosamente, ocorreu somente na América do Norte, através do Conselho de Charleston em 1800.

Na lenda do grau, como se pode perceber, está implícita a preocupação, já evocada por Jâmblico em relação aos Mistérios Egípcios, de que a Maçonaria não é uma prática que deva ser popularizada. É de se recordar que aquele filósofo deplorava a tradução para o grego daqueles Mistérios, entendendo ser a língua dos helenos imprópria para transmitir segredos de ordem iniciática, pois que a popularização de tais ensinamentos acabaria por abastardá-los. Esta também era a razão pela qual os alquimistas evitavam transmitir, de forma clara, o magistério da sua arte, que se tornou a ciência hermética por natureza. Aí está também, como vimos, a razão do silêncio exigido por todos aqueles que se iniciam em sociedades desse tipo. A Palavra Perdida é tomada aqui como segredo que deve ser guardado a sete chaves e somente transmitido aos iniciados que realmente tenham mostrado mérito para conhecê-la.

Os trabalhos do 14º grau realizam-se sob a abóbada secreta, que simbolicamente, se localiza num ponto qualquer do infinito. A idade do Perfeito e Sublime Maçom é o nove, quadrado de três, que é o numero perfeito. Os seus instrumentos de trabalho são o esquadro e o compasso, com os quais trabalha o pensamento e a inteligência. O inicio do trabalho é o meio dia em ponto, hora em que o sol está no seu zénite. Os trabalhos são abertos pelos Números Misteriosos, cuja soma total é 21. A abertura é feita pela leitura dos versículos 18 a 23 do capitulo 33 de Êxodo, onde Deus diz o seu nome a Moisés, mas não lhe mostra a sua face.

São executados três sinais, que só podem ser divulgados em Loja. São os sinais do Juramento, do Fogo e de Admiração, cada um representando um simbolismo ligado à aparição de Deus para Moisés no Monte Sinai e no pacto feito com ele e com o povo de Israel.

Na elevação ao grau 14 recordam-se todas as virtudes adquiridas nos graus precedentes. É uma espécie de rememoração da escalada da perfeição. Uma faca e um machado são colocados no centro do Templo, para que seja executado o sacrifício simbólico das paixões do iniciando. O grau evoca também a sua libertação pessoal, através do simbolismo do êxodo do povo israelita do Egipto. Pressupõe-se que neste grau, após o iniciado ter adquirido o conhecimento da Palavra Sagrada, estará ele em condições de perseguir a verdadeira sabedoria, que é o significado e a forma correcta de pronunciar esse Nome.

Um dos mais misteriosos mandamentos do Decálogo é justamente a proibição de pronunciar Nome de Deus em vão. Diz o Senhor que “não tomaria por inocente” aquele que o fizesse. Portanto, no tempo de Moisés já se cultivava a tradição de associar poder e sabedoria àquele que conhecesse esse Santo Nome, pois tal pessoa não era inocente.

Desta forma, o possuidor deste conhecimento não podia utilizá-lo irresponsavelmente. Para que o próprio Deus tivesse tal preocupação, é por que esta Palavra Sagrada, este Nome Inefável continha realmente, um poder inexprimível que somente pessoas iniciadas e com muita intimidade com Ele podiam fazer uso.

Para os cabalistas, este nome grafava-se Shemhamphorach, que quer dizer o principio. Diziam que este Nome era a base do Tetragrammaton, o número que equivalia ao significado do Nome Inefável, ou seja as iniciais do nome de Deus IHVH, que em português é Jeová. Todos os demais nomes de Deus eram produtos das suas manifestações, mas o Shemhamphorach era derivado da sua própria substância, por isso podia ser considerado o primeiro.

Uma vez mais é evocado o antigo ensinamento, magistralmente expresso na frase de Jesus, segundo a qual quem conhece a verdade é realmente livre. Assim, a evocação ao Nome Inefável de Deus, como supremo conhecimento, é a verdade que liberta. Moisés somente adquiriu o poder para libertar o povo hebreu do Egipto após adquirir este conhecimento.

Rizzardo da Camino lembra bem que hoje a face política da escravidão já não causa tanto horror e constrangimento. O que hoje mais se propugna é pela libertação moral do ser humano, libertação essa que se consubstancia na vitória do individuo sobre si mesmo, libertando-se dos vícios e das paixões que o escravizam.

Os actos cerimoniais que se fazem por ocasião da elevação do iniciando ao 14º grau são conotativos desse ideal. O candidato “imola” as suas paixões no altar dos sacrifícios; no Mar de Bronze mergulha as suas mãos como símbolo da materialidade que ali se dissipa, como ocorrido na Lenda de Hiram ; depois, com o óleo sagrado “ que desce pela barba de Arão até a orla dos seus vestidos”, misturado ao vinho e à farinha de trigo, simbolizando os materiais da ceia mística, o iniciando é consagrado pelo Presidente da Loja. O discurso do Presidente evoca a ideia da Fraternidade existente entre os homens que comungam de um mesmo ideal e de uma mesma fé. Tendo ele encontrado a Palavra Perdida, fez-se merecedor da fita do Mestre Secreto com o Nome Inefável nele inscrito, grafada pelo nome Jeová (Iavhé).

Ele agora sabe quem é o seu Deus, e está livre dos vícios de carácter que o impediam de seguir adiante, superando os limites da matéria e ingressando nos domínios do espírito. Por isso é que a liturgia do grau sempre evoca, em primeiro lugar, a admiração pela mágica do nome revelado, e a infinitude que se revela aos seus olhos. O conteúdo metafísico do grau é exprimido por um diálogo entre o Presidente, o 1º Vigilante e o Orador, no qual estes discorrem sobre o conceito de infinito e as suas relações com o divino, o profano e a doutrina maçónica, proclamando ainda, como verdadeiro auto de fé, a livre convicção religiosa, que se exprime na crença da existência de Deus, única e simplesmente, sem qualquer necessidade de prova material ou filosófica dessa existência.

Este diálogo exprime as ideias antigas e modernas sobre o conceito de Deus e as suas manifestações, que é o universo visível e invisível. Tanto poderia ser encontrado nos versos da Baghavad Guita quanto num estudo dos modernos cientistas do átomo, da astronomia ou da biologia molecular. A noção do infinito e a sua correlação com o ínfimo incomensurável é uma intuição que pode ser encontrada, tanto na obra dos cientistas do átomo como na dos modernos teólogos, como Teilhard de Chardin, por exemplo, que extrapolam o conceito dos limites de tempo e espaço materiais, para situarem a origem de toda realidade num ponto qualquer algures, que não pode ser alcançado pela razão, mas pode ser “sentido” pela inteligência da emoção. É a volta da questão metafísica que sempre preocupou o homem desde que ele se mirou no infinito e sentiu a sua própria pequenez em confronto com a imensidade do universo.

Mas ele agora sabe que esta inquietude, esta sensação de esmagamento cósmico, é produto do movimento de uma alma à procura deste centro energético único, de onde um dia ela saiu como manifestação do pensamento divino e para onde um dia voltará como energia centrada no mais alto grau de potenciação.

A jornada do espírito humano é uma viagem à procura da Palavra Perdida, o Verbo Fundamental, a partir do qual tudo, inclusive ele mesmo, foi criado. E quando ele chega a esse conhecimento, quando aprende, enfim , essa Palavra, ele está livre da ignorância que o mantém escravo de uma vida chumbada a desejos sempre insatisfeitos, a angústias que jamais se curam, a propósitos que nunca se cumprem, a problemas que jamais se resolvem.

Nesse momento ele demole os seus antigos ídolos, queima os seus totens de decadência e passa a adorar o Único e Verdadeiro Deus, que é a Verdade. Conhecendo a Verdade o homem será, finalmente livre. Agora o Mestre Perfeito sabe o que significa essas proféticas palavras. Ele sabe que Deus existe e tem um Nome, um Nome que outorga o poder que vem do verdadeiro conhecimento, a felicidade que vem da prática da verdadeira virtude, o progresso que vem do trabalho, a confiança que vem da certeza de que Deus é Um, a Natureza é Uma, o Criador é Uno, e tudo faz parte de um grande organismo onde nada é descartado, mas tudo tem um sentido, uma importância e uma finalidade.

E com esta certeza o iniciado retorna à sua insignificância de micróbio perdido nas solitudes cósmicas, sabendo agora, entretanto, que o cosmo, sem ele, não existiria. A investidura neste grau, como pode se perceber, representa uma espécie de encerramento de uma etapa de iniciação, em que o neófito adquire a percepção necessária para passar para a etapa adiante, que são as Lojas Capitulares.

João Anatalino Rodrigues – Do livro “Conhecendo a Arte Real”, Publicado pela Ed. Madras, São Paulo, 2007.


Grau 13 – Cavaleiro do Real Arco (REAA)

 


Avental do Grau 13 – Cavaleiro do Real Arco (REAA)

A Loja funciona em Templo e toma o nome de Capítulo ou Loja Real.

Cinco são os Oficiais; o Presidente simboliza o rei Salomão e é denominado de Três Vezes Poderoso Mestre; tem assento ao Oriente sob um sofá ricamente ornamentado; na cabeça, uma coroa real e empunha um Ceptro.

O 1o Vigilante é chamado de Grande Vigilante e representa Hiram, rei de Tiro. Tem assento à esquerda de Salomão, ao Oriente; possui coroa que não coloca na cabeça; nas mãos, segura o Ceptro.

O 2o Vigilante chama-se Grande Inspector; tem assento no Ocidente e representa Adonhiram. Usa chapéu e uma Espada desembainhada na mão direita.

O Grande Tesoureiro representa Joabem; coloca-se ao Norte e está coberto por um chapéu.

O Grande Secretário coloca-se ao Sul e representa Stolkin; também está coberto.

O Capítulo representa um subterrâneo, sem portas nem janelas e comunica-se com o exterior por uma abertura quadrangular, feita na Abóboda que se atinge por meio de uma escada; a abertura é fechada por uma escotilha formada por uma pesada pedra- mármore; no centro da tampa, uma grande argola de ferro.

Os muros internos estão pintados de branco; o Pavimento, de quadrado brancos e negros.

No centro da Loja eleva-se, sobre um pedestal quadrangular, uma Pirâmide transparente, de três faces; em cada face, em caracteres hebraicos, está inserido o nome do Grande Arquitecto do Universo, em Tetragrama.

A Pirâmide é iluminada no seu interior por um Candelabro de três braços.

A Abóboda está sustentada por nove Arcos; em cada Arco vem escrito o nome de um Arquitecto, que representa nove denominações de Deus: Jod, Jhao, Ehleah, Eliah, Jareb, Adonai, El-Hanan, Jhao, e Jobel.

A Loja é iluminada por nove luzes afora o Candelabro na parte interior da Pirâmide; oito luzes formam um octógono ao redor do recinto e a nona no Altar, do Presidente.

O Painel é em formato de escudo, com bordos azul-escuro; na parte superior, abrangendo a maior parte do Painel, uma Abóboda subterrânea, dividida em sete partes, com as cores do arco-íris na parte superior, um cabeçote exterior.

O Grau 13 pode ser dado por comunicação mas recomenda-se que a Cerimónia de Iniciação seja realizada.

O Cavaleiro do Real Arco recebe ensinamentos oriundos dos Graus precedentes e visa propagar o ideal da Liberdade de Religião, com o aperfeiçoamento da instrução a todos os povos, com base na Justiça e no Progresso, destacando que a Maçonaria Harmoniza a Honra com o Dever.

O traje é negro com luvas negras.

A idade é de 63 anos, ou seja, sete vezes o quadrado de três.

A Bateria é de cinco golpes.

O início dos trabalhos, ao nascer do Sol; encerramento, no ocaso.

O Avental é todo vermelho; na parte central um Triângulo irradiado, com as bordas douradas e no centro letras em caracteres desconhecidos que conteriam o nome de Deus.

A Faixa é azul-noite e a jóia, um Triângulo vazado, em ouro.

A lenda de Enoque

As Sagradas Escrituras referem-se assim a respeito de Enoque:

coabitou Caim com a sua mulher, ela concebeu e deu à luz a Enoque. Caim edificou uma cidade e lhe chamou Enoque, o nome de seu filho

(Génesis 4:17)

Jarede viveu 162 anos e gerou a Enoque“.

(Génesis 5- 17)

Andou Enoque com Deus, e já não era, porque Deus o tomou para si

(Génesis 5:24)

Pela fé Enoque foi trasladado para não ver a morte: não foi achado porque Deus o trasladara. Pois, antes da sua trasladação, obteve testemunho de ter agradado a Deus”.

(Hebreus, 11:5)

A nossa personagem teria sido filho de Jarede e não de Caim; segundo a tradição, viveu no ano 3740 antes da Era Vulgar, e cujo nome significa, em hebraico: “O que muito viu, o que muito sabe”, também é conhecido dos muçulmanos com o nome de Adris que significa “sábio”.

As profecias e maravilhosos relatos de Enoque em que o povo acreditava cegamente, assim, como os seus devaneios e venturosos sonhos estão registrados nas Sagradas Escrituras antigas, vez que nas da actualidade omitem o livro que leva o seu nome.

Durante um desses sonhos, conheceu o verdadeiro nome de Deus, que lhe foi proibido de pronunciar, e noutro sonho, foi-lhe mostrado o cataclisma que em breve assolaria a Humanidade, com o nome de Dilúvio.

Enoque, então, decidiu preservar de catástrofe o verdadeiro Nome de Deus, fazendo-o gravar numa pedra triangular de ágata, em certos caracteres místicos.

Nada se conhecia a respeito da pronúncia daquele Nome, a não ser ele Enoque, por tê-lo ouvido do próprio Deus, que o traçou em hieróglifos misteriosos.

Fez Enoque gravar em duas Colunas, sendo uma de mármore e outra de bronze, os princípios em que se baseavam as ciências e artes da época a fim de que, também, passassem para a posteridade.

Após, fez Enoque construir um templo debaixo da terra, consistindo em nove abóbodas, sustentadas por nove arcos, depositando na mais profunda, o Delta de ágata e na entrada da primeira, duas Colunas, fechando a entrada com uma grande pedra quadrangular, provida de possante argola de metal no seu ceptro para que pudesse ser removida.

Advindo o Dilúvio, todos os habitantes da Terra sucumbiram, excepto Noé e a sua família que passaram a constituir a única espécie humana.

Das Colunas gravadas por Enoque, apenas a de bronze chegou à posteridade, pois a de mármore foi destruída pelas águas.

Nenhum ser humano podia pronunciar o Nome verdadeiro de Deus, antes que fosse revelado a Moisés, no Monte Sinai.

O legislador do povo hebreu mandou fazer uma grande medalha de ouro, gravada com o Nome Inefável, colocando-a na Arca da Aliança, tendo, antes, o cuidado de revelar o seu significado ao seu irmão Arão.

Numa batalha contra o rei da Síria, em que caíram feridos os que a guardavam, perdeu-se a Arca, ficando abandonada na mata.

No entanto, ninguém podia aproximar-se dela sem que um leão que guardava a sua chave, o atacasse e o destroçasse.

Mas numa oportunidade em que o Grande Sacerdote dos Levitas, acompanhado do seu povo, dirigiu-se ao local onde estava a Arca, com o propósito de reavê-la, notaram que a fera vinha ao seu encontro, mansamente entregando-lhe a chave que trazia na sua boca, permitindo que a Arca fosse dali removida.

Este leão significa para nós o emblema do pensamento que se rebela contra a força, porém permite a entrada da Verdade.

A divisa do Grau 13: In Ore Leonis Verbum Inveni quer dizer: “Achei a palavra na boca do leão”, o que indica que devemos proclamar a Verdade e mantê-la como principal qualidade de um povo civilizado.

Na época de Samuel apoderaram-se da Arca os filisteus, fundiram a medalha de ouro, construindo com ela um ídolo Para adoração dos pagãos.

Ficou, novamente, perdido o nome de Deus, para todos, excepto para os reis de Israel, que tradicionalmente, o pronunciavam e sabiam o depósito sagrado feito por Enoque, ainda que desconhecessem o lugar onde o Delta estava oculto.

Transcorreram os anos. David, rei de Israel, concebeu o projecto da construção do Templo de Jerusalém e o seu filho Salomão o executou.

Antes, porém, de consagrar o Templo à Glória do Grande Arquitecto do Universo, quis fazer um esforço supremo para localizar o Triângulo escondido por Enoque.

Com tal objectivo, escolheu três Mestres da sua maior confiança cujo valor e perseverança haviam demonstrado em muitas outras ocasiões, incumbindo-os de pesquisarem a respeito.

Chamavam-se esses três Mestres Eleitos: Adonhiram, Stolkin e Joabem, os quais, após penosas viagens e grandes estudos, lograram descobrir a Abóboda em que o Sagrado Delta estava guardado,

Desde então a representação gráfica inscrita, representando o Nome verdadeiro do Grande Arquitecto do Universo.

Porém, não sabemos pronunciá-lo, porque as águas do Dilúvio destruíram a Coluna de Mármore em que Enoque gravara o Código para decifração daquele Nome Inefável e como devia ser pronunciado por lábios humanos.

Os trabalhos do Grau 13 findam com uma prece:

Poderoso Soberano Grande Arquitecto do Universo.
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Vos que penetrais no mais recôndito dos nossos corações, acercai-vos de nós para que melhor possamos adorar-vos, cheios de vosso santo Amor. Guiando-nos pelo caminho de Virtude e afastando-nos da senda do vício e da impiedade.
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Possa o selo misterioso imprimir nas nossas inteligências e nos nossos corações o verdadeiro conhecimento de vossa essência e Poder Inefável, e assim como temos conservada a recordação de vosso Santo Nome conservai, também, em nós o fogo sagrado de vosso Santo Temor, principio de toda Sabedoria e grande profundidade do nosso Ser.
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Permiti que todos os nossos pensamentos consagrem-se à grande obra da nossa perfeição, como recompensa merecida dos nossos trabalhos e que a União e a Caridade estejam, sempre, presentes nas nossas Assembleias, para podermos oferecer uma perfeita semelhança com a morada de vossos escolhidos que gozam de vosso Reino para sempre.
.
Fortalecei-nos com vossa luz, para que nos possamos separar do mal e caminhar para o bem.
.
Que todos os nossos passos sejam para Glória e proveito da nossa aspiração, e que um grato perfume se desprenda do Altar dos nossos corações e suba até vós.
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O Jeová, nosso Deus! Bendito sejais, Senhor. Fazei com que prospere a obra feita pelas nossas mãos, e que sendo vossa Justiça o nosso guia, possamos encontrá-la ao término da nossa vida.
.
Amém“.

Rizzardo do Camino

Fonte

  • Extraído do livro “Rito Escocês Antigo E Aceito (Graus 1ª Ao 33º)”, Madras


Grau 12 – Grão-Mestre Arquitecto (REAA)

 



Avental do Grau 12 – Grão-Mestre Arquitecto (REAA)

O grau doze é denominado Grão-Mestre Arquitecto, e, como o seu nome deixa entrever, refere-se aos segredos da construção. Da mesma forma que o grau anterior, ele é dado por comunicação, não obstante o elevando deva conhecer o seu conteúdo , pois que ela encerra alguns dos mais importantes ensinamentos do conjunto da doutrina maçónica.

A Loja é denominada “ Loja dos Grãos-Mestres Arquitectos”. Por isso é que o seu painel destaca com mais propriedade os símbolos dos artífices construtores, bem como os resultados do seu ofício, simbolizados no esquadro com o vértice voltado para baixo, cinco colunas formando uma perspectiva planisférica, (uma menor no meio, duas maiores ao lado, duas maiores que estas nas extremidades), e um compasso aberto em 45º por sobre o esquadro, com as letras R N. Nas paredes, os cortinados brancos, salpicados de chamas, lembram as etapas pela quais o psiquismo do iniciando deve passar para realizar o processo regenerativo da sua consciência. No Oriente, uma estrela flamígera reina, soberana, entre as sete estrelas da Ursa Maior, para mostrar que é deste centro agregador de energia que provém a luz que fará do Maçom esse homem novo, regenerado, pronto para ser a pedra de sustentação do edifício social.

Nas mesas consagradas ao Presidente da Loja, e aos 1° e 2º Vigilantes, são colocados estojos de matemática e um candelabro de três luzes. O estojo contém um compasso de cinco pontas, uma régua paralela, um tira-linhas e uma escala. Estes são os instrumentos de trabalho do operário Maçom. O presidente da Loja é tratado por Grão Mestre e os Vigilantes por Mestres Arquitectos.

Diz a lenda do grau que o rei Salomão, ao ouvir os clamores do povo, sendo ele um rei justo e sábio, quis dar uma organização ao seu cronograma de obras, não só visando terminar a construção do templo, mas também outras construções de interesse do seu governo.

A Bíblia fala da construção do famoso Palácio de Salomão, construção que levou treze anos para ser erigida. E também da Casa do Bosque do Líbano, que, ao parece, era uma espécie de Tribunal, onde se processavam os seus famosos julgamentos. Diz a Bíblia que

“Todos estes edifícios eram de finíssimas pedras, que tinham sido serradas de uma mesma forma e medidas, tanto por dentro como por fora, desde os fundamentos até o cimo das paredes, e por fora até o átrio maior. Os fundamentos também eram de pedras grandes de dez ou de oito côvados. E dali para cima havia pedras belíssimas cortadas em igual medida, e cobertas também de cedro. E o átrio maior era redondo, de três ordens de pedras cortadas, e de uma ordem de cedro lavrado; e o mesmo tanto no átrio interior da casa do Senhor, como no pórtico da casa”.

(Reis, 1 a 9)

Estas informações do cronista bíblico dão-nos conta de quão desenvolvida era a ciência dos Obreiros da Arte Real, já na época de Salomão. E reforça a nossa crença de que os introdutores das tradições hebraicas nos ritos da Maçonaria moderna, longe de criarem “monstruosidades supersticiosas inúteis”, como disse Samuel Pritchard, sabiam muito bem o que faziam com o desenvolvimento destas lendas. Na verdade, a construção do Templo de Salomão, bem como a estrutura do Reino de Israel, a sua mística e a sua organização política, tem tudo a ver com a ideia de uma Maçonaria mundial, estabelecida como elo espiritual entre homens de boa vontade, cujo ideal comum é encontrar, finalmente, a fórmula segura para se construir a utopia longamente sonhada.

Já vimos que nas mais antigas disposições a respeito da Arte Real já se encontram alusões às excelências da arquitectura hebraica. As antigas tradições estabelecem uma ligação entre a construção do Tabernáculo, que foi uma espécie de templo itinerante construído pelos israelitas no deserto, quando eles ainda peregrinavam em busca da terra da promessa, e a edificação do Templo de Salomão. Anderson, com a imaginação que caracteriza os seus escritos, diz que “deixando de lado o que não pode ser comunicado por escrito, podemos com autoridade afirmar, que por mais ambiciosos que os Pagãos tenham sido para cultivar a Arte Real, eles não atingiram jamais a perfeição, até que Deus se dignou a ensinar o seu Povo eleito a construir a majestosa Tenda supra mencionada, e a construir, afinal, essa magnífica Casa, própria à Refulgência especial da sua Glória, onde ele morava entre Querubins, sobre o Propiciatório, e de onde dava frequentemente as Respostas oraculares.”

As disposições dadas por Deus para a construção do Tabernáculo foram reproduzidas na construção do Templo de Salomão, propriamente dito. Reza a tradição que cada Loja maçónica é uma representação simbólica daquele templo. Desta forma, o que se quer mostrar com este simbolismo arquitectónico é, nada mais nada menos, a forma pela qual o Grande Arquitecto construiu o mundo. O Tabernáculo, bem como o Templo de Salomão, é a representação do próprio universo. Esta é a ideia que nos é passada por todos os manuais maçónicos.

João Anatalino Rodrigues – Do livro “Conhecendo a Arte Real”, Madras, São Paulo, 2007.